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Asas Memórias | Missionário Paulo Corenchuc conta a sua Experiência

A Aviação Missionária surgiu com o intuito de encurtar distâncias e facilitar a ida e vinda de Missionários.



Abaixo, você encontra o relato feito por Paulo Corenchuc em 1977, um missionário da Missão Novas Tribos do Brasil que viu a importância da Aviação Missionária, viu a importância de Asas de Socorro para que o Evangelho fosse levado até os confins da Terra.


Hoje é dia 17 de fevereiro de 1977. É uma data especial. Pelo menos para nós aqui neste posto de trabalho na tribo Uaicá, chamado Marari. Hoje é o aniversário da esposa de um de nossos companheiros de trabalho, mas também é o aniversário de nosso campo de pouso. Há seis anos neste mesmo dia, o aviã o PT-BJY, pilotado por um piloto de Asas de Socorro, tocava suas rodas nos 400 metros de terra que havíamos preparado durante anos. Você não poderia imaginar quantas toneladas de paus foram removidas ou queimadas. Quantos tocos foram arrancados com o uso de umas cavadeiras e alguns machados. Quanta terra saiu dos barrancos para encher os buracos.
Mas, para lhe dizer a verdade, já nos esquecemos de todo o labor. Só nos lembramos quando vamos escrever sobre o assunto ou quando alguém nos pergunta. O sucesso do campo de pouso aqui ultrapassou todas as expectativas, de forma que nem nos lembramos do trabalho árduo que tivemos.
Sou um missionário brasileiro. Entreguei-me à obra missionária atendendo a um chamado divino para alcançar as tribos do nosso imenso Brasil. Nos meus primeiros contatos com a selva, os rios e a solidão da vasta Amazônia, já pude perceber que a obra missionária entre os índios jamais poderia ser feita por um ou dois indivíduos solitários. Quem iria ajudar nas longas viagens pelos rios? Quem cuidaria da base durante os contatos? Teria o missionário de sair da tribo, indo à cidade cada vez que precisasse de alguns quilos de açúcar ou café? Portanto, o trabalho de equipe era essencialmente necessário.
Fui engajado numa equipe que abriria este trabalho no Marari. Quanta gente era preciso para abrir um trabalho! Éramos quatro homens escalados, fora os que nos eram “emprestados” por tempo limitado. E muitas vezes era pouco.
Mas então, estes quatro homens fariam uma viagem de 7 ou 10 dias para comprar o necessário na cidade, isto, digamos, de 3 em 3 meses? E o trabalho, ficaria parado durante este tempo? Para evitar isto, formou-se a “equipe do suprimento”, com outros quatro ou cinco homens. Eles é que fariam as viagens para suprir os postos. Subiam de lancha até onde começavam as cachoeiras. De Manaus até lá, sete ou oito dias. O problema é que os índios estavam muito acima das cachoeiras. Daí surgiu a necessidade de uma base na primeira cachoeira, para de lá alcançarmos as aldeias subindo em canoas. Com a base estabelecida, precisávamos de uma família sempre lá para cuidá-la. Está compreendendo toda a confusão? Está percebendo quantos “homens-hora” envolvidos no estabelecimento de um único trabalho?
Contudo, o dia chegou em que a base foi abandonada, a equipe de suprimento foi desfeita, nossa missão vendeu as lanchas usadas nas viagens e nós vendemos as canoas.
Insucesso no trabalho? Visão perdida? Desanimados? NÃO! Toda esta revolução no nosso serviço foi causada por um aparelho de duas asas, chamado Cessna 206, e pelo ideal de um grupo de homens de Deus interessados em diminuir o sofrimento e apressar o progresso deste trabalho.
Não mais teríamos de fazer estas longas viagens pelos rios. Não mais teríamos de gastar horas abrigados nas enseadas do Rio Negro esperando as águas se acalmarem depois de um temporal. Muitas vezes já ficamos 24 horas e, por duas vezes, lembro-me de termos ficado 36 horas sem mover um metro, esperando o tempo acalmar. Já não mais teríamos de arrastar nossas canoas carregadas pelas dezenas de cachoeiras dos rios Padauiri e Marari. Não teríamos de cortar árvores caídas para abrir passagem no rio. Não mais teríamos de andar, famílias inteiras, os 10 quilômetros entre o rio e a aldeia dos índios. Estes são os motivos porque eu disse “diminuir o sofrimento”.
Como o avião “apressou o progresso”? Nestes seis anos de serviço aéreo, este posto jamais ficou sem missionários. Com o serviço fluvial isto era impossível, pois, adoecendo um companheiro, os outros teriam de sair juntos para levá-lo à cidade, enquanto o outro ficava cuidando da base, deixando a aldeia sozinha. Muitas vezes, depois de curado o doente, um dos outros dois ou a esposa também adoecia e todos tinham que esperar. Eu gastaria muito tempo e papel escrevendo a respeito das nossas lutas com enfermidades.
Depois do início do serviço aéreo houve muitas enfermidades, mas só saía o doente. Os outros continuavam sem interrupção. Lembro-me de pelo menos cinco casos em que o avião levou missionários doentes daqui deste posto.
E os integrantes da equipe de suprimentos voltaram para suas casas? Não. Outros trabalhos foram abertos e eles foram encaixados. Ao invés de nove casais envolvidos neste trabalho, temos agora apenas três.
Então, gostaria de dizer a vocês, os mantenedores de Asas de Socorro, que nós, os missionários entre os índios, lhe somos muito gratos pela disposição e liberalidade com que contribuem para facilitar em todos os aspectos o nosso trabalho. Você tem uma parte vital no sucesso deste trabalho. Seus pilotos não ficam fazendo turismo: eles trabalham duro. Hoje ouvimos pelo rádio que dois médicos e um piloto comercial perderam a vida quando tentavam chegar a um posto indígena, não distante de nós. Não sabemos todas as causas do acidente, mas sei que a boa manutenção, o bom senso e a experiência são fatores essenciais para a segurança dos voos nesta perigosa região E isto nossos pilotos têm, graças a Deus. E também a vocês, pois os bons aparelhos e os bons equipamentos são resultado do interesse que vocês demonstram neste grande empreendimento.

Paulo Corenchuc | Missão Novas Tribos do Brasil


 

NOTA


O missionário Paulo Corenchuc sofria de leucemia, a qual veio a se agravar no mesmo ano em que ele escreveu este testemunho. No final do ano de 1977 foi afastado do trabalho onde estava desde 1965 e levado para tratamento em Manaus e depois para São Paulo. Prevendo sua partida para o céu, aproveitou todas as oportunidades, dando assim um testemunho maravilhoso da paz que reinava em seu coração em meio a tanta dor. Sua enfermidade foi um veículo para levar muitos a Cristo. O missionário Paulo faleceu em maio de 1978.

 



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